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Viaje por um outro Rio Grande do Sul

O que há além da hospitalidade gaúcha, da imensidão dos pampas, do mate amargo e das célebres vinícolas serranas
  • Publicado: Sexta, 01 de Janeiro de 2010, 22h58
  • Última atualização em Quarta, 30 de Dezembro de 2009, 16h09
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Por trás de uma generosa picanha que descansa, salgada e suculenta, sobre um campeiro fogo de chão, há um estereótipo a desbancar. Assim como o chimarrão, o churrasco é lema, bandeira, hino para os gaúchos. Talvez por isso essas referências fiquem tão evidentes a ponto de tornarem difícil imaginar o Rio Grande do Sul sem esses dois ícones de sua cultura. Mas desta vez, esqueça a costela de boi assada na brasa, as hortênsias a 0ºC na região da serra, a seqüência de degustação nas vinícolas e as gaitas sanfonando a beleza das prendas nos CTGs. Você vai conhecer um outro Rio Grande do Sul.

As temperaturas de verão são, digamos, nordestinas. Em um oásis de água fresca e sombra farta, entretanto, o calor se transforma rapidamente em um convite para trilhas, mergulhos e experiências próximas à natureza. O Salto do Yucumã, maior queda d’água longitudinal do mundo, é a preciosidade do Parque Estadual do Turvo, que pertence ao município de Derrubadas, na fronteira com a Argentina e o estado de Santa Catarina. O parque é o último reduto da onça-pintada no estado, e também serve de abrigo para outras espécies ameaçadas de extinção, como o puma, a anta e o pica-pau rei.

Preciosidades, aliás, brotam aos quatro ventos desta terra. Há menos de uma hora dali, a cidade de Ametista do Sul possui uma das maiores jazidas da pedra ametista no mundo. Exportada para mais de quinze países pelo seu alto valor comercial, a pedra é encontrada em galerias subterrâneas abertas à visitação no Ametista Parque Museu. Lá, turistas podem conhecer os garimpos e o processo de extração da ametista dos paredões de rochas de uma mina desativada. Na praça central da cidade, uma pirâmide de interior recoberto pelo cristal convida para um momento de meditação.

“Todo turista que busca esse destino entende que as pedras têm uma função mística, energética”, avalia a diretora da operadora Rota Cultural Turismo, Susana Abreu. Segundo ela, a busca pelo esoterismo e pela “boa energia” dos cristais deve impulsionar a comercialização de roteiros que integram Ametista do Sul e Derrubadas, duas cidades bem estruturadas e que vêm ganhando expressão turística no estado. “A questão da busca por um turismo de experiências, por locais diferentes e por roteiros ecológicos deve aumentar de 10% a 18% a venda deste tipo de pacote em 2010.”, avalia Susana.

Não são poucos, aliás, os roteiros alternativos à badalação, que sugerem retiro espiritual durante a virada de ano ou as festas de carnaval. Na porção noroeste do estado, as coxilhas onduladas guardam uma história secular, onde a utopia de uma sociedade justa e solidária pode ter se tornado verdade. É o que revela, em 325 km de percurso, o emblemático Caminho das Missões.

O itinerário é um mergulho na trajetória das Missões Jesuítico-Guarani: 30 reduções, pequenas comunidades, foram fundadas durante o século 17 em territórios hoje pertencentes ao Paraguai, Brasil, Argentina e Uruguai. O objetivo da Coroa Espanhola era conquistar o território nas fronteiras dos impérios coloniais e difundir a fé cristã. Padres da Companhia de Jesus foram enviados e iniciaram a catequização de 150 mil índios guaranis.

Com a fusão das culturas indígena e européia, o ideal guarani da “Terra Sem Males” originou um novo modelo de civilização, “com um sistema social e econômico cooperativo e um alto grau de desenvolvimento tecnológico e cultural”, conta a historiadora Gladis Pippi.

As reduções prosperaram, mas com a expulsão dos jesuítas e a eclosão da guerra guaranítica, quase toda a população indígena foi dizimada e essa experiência acabou em pouco mais de 150 anos. Além da imortalidade desta cultura, restaram as ruínas de Sete Povos das Missões, por onde turistas e peregrinos hoje caminham em busca das lembranças da chamada “saga missioneira”.

Passar por sete cidades a pé é, relativamente, uma atividade de fôlego. Mas o fato é que o peso da mochila e do cajado não afugentou caminhantes do Brasil e do mundo desta experiência. Se for primavera, tanto será melhor. As paisagens revelarão todas as suas cores. Se for Lua Cheia, mais perfeito ainda. Muitos espetáculos do roteiro não podem mesmo ser apreciados no cotidiano. Muitos descobriram neste Caminho das Missões um jeito de meditar, uma janela para o autoconhecimento, ou, simplesmente, uma oportunidade para respirar o ar puro do interior brasileiro ou uma chance de ver a vida com outros olhos.

A mineira Daniela Karam tanto gostou que já fez o Caminho por duas vezes. A última foi durante o Carnaval deste ano, acompanhada pela irmã. “Para mim viajar é um prazer e caminhar é quase uma meditação. Tem algo de espiritual nisso também, é com certeza um momento introspecção”, revela a designer. No caminho, os hospitaleiros hospedam e cozinham para os caminhantes, o que, segundo Daniela, é uma vivência que diferencia essa modalidade de turismo. “Não tenho um desejo plástico de turismo. E este é um turismo diferente porque as instalações são muito simples e faz parte da proposta abrir mão de um bom hotel para focar na descoberta de outras maneiras de viver bem com simplicidade. Você não tem luxo, mas tudo lá é muito aconchegante”, define.

Num dos maiores corredores histórico-culturais da humanidade, a velha e boa gastronomia regional encanta os visitantes. Mas não só: a arte e o artesanato do indígena missioneiro saúdam o primeiro herói indígena brasileiro, Sepé Tiaraju, e recentes descobertas arqueológicas podem ser visitadas durante o percurso. Sítios arqueológicos como o de São Miguel das Missões, Patrimônio Histórico e Cultural da Humanidade tombado pela UNESCO, continuam bem preservados. A igreja de São Miguel, por exemplo, dá idéia do avanço das técnicas da época: foi toda esculpida em pedra grês por mão-de-obra indígena, sendo que as pedras teriam sido retiradas de afloramentos rochosos dos arredores.

O Caminho das Missões pode ser feito a pé ou de bicicleta, individualmente ou coletivamente, em 13, 7 ou 3 dias. Uma parte do percurso é vencida de barco, sob as águas do rio Uruguai. Antes da partida, na cidade de São Borja, os peregrinos participam de uma preparação técnica e mística, e recebem um amuleto. A chegada dos caminhantes se dá em Santo Ângelo, em frente a um exemplar recém-restaurado do conjunto arquitetônico missioneiro: a Catedral Angelopolitana.

UM PORTO MUITO ALEGRE
Porto Alegre, capital do Rio Grande do Sul, é um dos 65 destinos indutores do desenvolvimento turístico regional, municípios brasileiros que são o foco da política de regionalização do Ministério do Turismo. Esta metrópole, de traços joviais e reconhecida força econômica, tem no lago Guaíba o seu vizinho mais bonito. No coração verde da cidade, o Parque Farroupilha, apresenta dominicalmente o Brique da Redenção, uma tradicional vitrine da alma portoalegrense. Artistas plásticos, atores, capoeiristas, roqueiros, cantores líricos, artesãos e vendedores promovem o “encontro casual” das artes, antigüidades, cachorros a passeio, crianças de patinete, bandeirantes políticos, e, vejam só, turistas.

A capital mais meridional do Brasil oferece efeitos de cores no céu durante o pôr-do-sol. A aquarela fica especialmente bela em um passeio de barco pelo Guaíba, onde se revelam as paisagens das ilhas do Parque Estadual do Delta do Jacuí.

Porto Alegre também tem eventos de grande porte para todas as idades. A maior Feira do Livro a céu aberto da América Latina tem espaço na Praça da Alfândega e no Armazém do Cais do Porto. No Porto Alegre Em Cena, os mais importantes grupos de teatro, dança e música do Brasil e do mundo se encontram para apresentar mais de 50 espetáculos a preços populares, em apenas duas semanas. Já a Bienal de Mercosul, referência internacional nas artes visuais, promove o acesso democrático à arte para mais de meio milhão de pessoas, a cada edição.

À noite, a Cidade Baixa, bairro antigo de arquitetura açoriana, é o ponto mais boêmio da cidade, com ambientes undergrounds. O Bom Fim, tradicional bairro judeu, é o preferido da juventude. O circuito glamoroso fica por conta do bairro Moinhos de Vento e na praia de Ipanema, na orla do Guaíba, a descontração predomina.

Se a serra gaúcha e o parque dos Aparados da Serra eram as únicas unanimidades do turismo gaúcho para quem pretende viajar neste verão, então agora o cardápio está um pouco mais completo.

81 MOTIVOS PARA VIAJAR PELO BRASIL
Essas e outras atrações do Rio Grande do Sul integram os 81 roteiros estruturados por meio do Programa de Regionalização do Turismo – Roteiros do Brasil, do Ministério do Turismo. Esses roteiros contemplam 345 municípios de 113 regiões turísticas do país.

Lançado em 2004, o programa trabalha o desenvolvimento do turismo regional em todo o país e a gestão descentralizada dos destinos. O objetivo é estruturar, diversificar e qualificar a oferta turística brasileira para inserir, de forma competitiva, o produto Brasil no mercado internacional.

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